sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Cata-vento e passarinho

É muito difícil falar do trabalho de quem a gente gosta tanto. Manter uma certa distância, quando se quer mesmo é ficar perto. Coisas de saudade, admiração e amizade. Talvez por isso demorei a escrever sobre Um Pé de Vento (texto e ilustrações de André Neves, Projeto), que há meses acarinha os sentidos de todos aqui em casa. Ele, o livro, não aceita a estante. Está sempre de lá pra cá como folha no bico de um pardal, ou nos braços de um cata-vento. Uma hora está no quarto, outra na sala, vez em quando passeia na rua, mas sempre ao alcance dos olhos. André, é querido dos Roedores. Por isso a saudade e o cuidado descritos acima. Hoje de manhã o Mozart resolveu tocar alguns de seus Divertimentos e a casa ganhou ares de campo. Abri as janelas. Pude sentir o perfume da relva. Com o olhar distraído, nem vi quando o livro chegou aos meus braços. Mas, assim, como quem não quer nada, Mozart, André Neves, o vento e o livro pousaram e buliram com as minhas emoções.
Neste livro, o autor nos oferece várias leituras. O texto, fala da menina Íris que conversa com árvore e adora girar cata-vento. Fala do encontro da menina com o menino Cristalino. Árvore, menina e menino são cúmplices desta história de amor. Amor de criança. O susto da descoberta, o prazer de estar junto e a hora de ficar sozinha. Sozinha? Não é bem assim. André tem exercitado sua prosa cheia de poesia que a cada livro fica mais bonita e cheia de surpresas. Numa segunda leitura, você percebe que não deu atenção ao tempo, ao vento... Vai descobrindo as sutilezas e o livro fica ainda mais bonito.
As ilustrações são primorosas. Eu tenho paixão pelas árvores de André. Ele consegue texturas incríveis trabalhando com diferentes tecidos. Seu traço, inconfundível, ganha contornos fantásticos com riquezas de detalhes. Observe as rendas que passeiam pelo livro. Imagine o cuidado para fazer a grama com picotes de papel. Tanta beleza é de arregalar os olhos. Experimente, então, ler o livro só pelas imagens. Elas também contam uma história. Os cabelos da menina estão sempre ao sabor do vento. Do meio pro fim, André nos apronta mais uma de suas peraltices. Desde o momento em que Cristalino aparece, o menino segue acompanhado de um pássaro e a menina, de um cata-vento. Eles brincam juntos até a penúltima página. No fim, desaparecem o menino e o cata-vento. A menina Íris corre de volta pra casa na companhia do pássaro. Não está sozinha. Cristalino segue “grudado nos olhos da menina”.
Este André Neves é mesmo cheio de histórias. Carrega-as consigo quase em segredo. Mas são tantas que, ora escapole uma, ora escorrega outra pela seiva da sua imaginação. Seiva porque em André o corpo é parecido com a árvore de Íris. Traz enraizadas “histórias que enchem aos poucos o coração e deixam os olhos com uma luz especial”. Somos curiosos, André. Queremos mais. E menos saudade.
P.S. Nesta foto, uma noite plena de histórias na casa de outra Íris, a Borges, em novembro passado. Ana Paula, Íris, Ana Claudia Ramos, André Neves e euzinho. Tudo de bom!!!

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Tloc e pluf...

Novamente me entreguei ao prazer de ler Monteiro Lobato. Incrível como o seu texto me conquista mesmo tanto tempo depois. Agora, recomeçando a ler o Reinações de Narizinho, me vi Lúcia, a Narizinho, me fartando embaixo do pé de jabuticaba. Coisa que ainda faço hoje, como na foto abaixo, tirada no último 25 de dezembro. Sabor de infância, sabor de boa literatura, sabor de felicidade, pois ainda me vejo moleca. Sabor que divido com vocês agora. Vai uma jabuticaba aí? Se não tiver, pesca o Monteiro Lobato aí da estante e leia um pouquinho, só pra deixar o domingo ainda mais gostoso. Ah... o Sítio do Lobato não está assim tão ao alcance? Então saboreie um pouco do gênio:
No sítio de Dona Benta havia vários pés, mas bastava um para que todos se regalassem até enjoar. Justamente naquela semana as jabuticabas tinham chegado “no ponto” e a menina não fazia outra coisa senão chupar jabuticabas. Volta e meia trepava à árvore, que nem uma macaquinha. Escolhia as mais bonitas, punha-as entre os dentes e tloc! E depois do tloc, uma engolidinha de caldo e pluf! – caroço fora. E tloc,pluf, -tloc, pluf, lá passava o dia inteiro na árvore.” (Reinações de Narizinho; Jabuticabas. Monteiro Lobato).
Ê vida boa!!! Tloc e Pluf pra vocês. Hatuna Matata!!!

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Poesia é voar fora da asa.

Hoje eu tomei ares de passarinho. Ganhei uns anos pra trás. Virei menino e desaprendi. Inocência. Independência. Infância. Hoje eu mergulhei feito borboleta no ar. Sem medo de me afogar. Arrepio de quem escuta as cores no quebrar das ondas do mar. É que hoje, na livraria, sentado no chão feito criança, passei a tarde na companhia dos livros de Manoel de Barros. Tantos. Que tenho em casa. Que sei de cor. Que guardo no desejo de quem sabe, um dia. E aí, fiquei assim: bobo, tonto, livre. Feliz. Obrigado, Poeta.

P.S.1. O título deste post é de autoria de Manoel de Barros e foi compilado do Livro das Ignorãças (sic).

P.S.2. Na imagem acima uma brincadeira com a caricatura do Poeta Manoel de Barros feita por Ziraldo no livro O Fazedor de Amanhecer e eu, ali, pequenininho, traço querido do amigo Ivan Zigg.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Tão bom que fiquei chato!

Recentemente descobri o livro Historinhas em Versos Perversos (Roald Dahl, com ilustrações de Quentin Blake, Salamandra) e fui acometido da chatice de quem adora um livro e sai espalhando para todos, sejam amigos ou estranhos. Na sessão de literatura infantil na livraria, eu não podia ver alguém próximo, com aquela cara de dúvida dobre qual livro levar, que eu chegava de mansinho com os versos perversos em mãos e lia uma história. Pronto. As dúvidas sumiam da vista do leitor e ele saia folheando o exemplar em direção ao caixa. Não foram poucas as vezes que li para os amigos em casa ou num café (sim, o livro passeou por dias na minha maleta). Geralmente, eu contava duas histórias de uma vez só: Chapeuzinho Vermelho e o Lobo e Os Três Porquinhos. As minhas preferidas.
Bem, depois desta revelação você deve ter torcido o nariz dizendo: - Ah, mas estas histórias o mundo inteiro já conhece!!! Pois é! E esta é a graça maior e a grande sacada de Roald Dahl. O autor reconta estas e mais quatro histórias em versos e rimas, tudo com muito ritmo, porém, fora do script que todos conhecemos. O príncipe de Cinderela tem mania de cortar cabeças e a nossa pobre heroína se casa com um vendedor de geléias. João, aquele do pé de feijão, não gostava de tomar banho e fedia como um gambá, por isso o gigante sentia o cheiro dele de longe. Em Branca de Neve, o tal espelho mágico vira um oráculo para que os anões apostem nas corridas de cavalos. E Cachinhos Dourados se transforma numa menina mimada, enxerida, ranheta, ladrona e esperta. Mas não pense que eu estraguei as surpresas do livro. Há muito com o que se surpreender.

A tradução cuidadosa de Luciano Vieira Machado mantém o humor e a sagacidade do texto original, lançado em 1982. Parceiro de Roald Dahl numa trilha de sucessos literários, assim como Roberto e Erasmo Carlos são na música, o ilustrador Quentin Blake não deixa a desejar e compõe com maestria os espaços destinados aos desenhos. Só sinto que a edição em português não tenha o cuidado gráfico da edição inglesa. Nesta, há mais ilustrações e o formato é maior. O mais intrigante é que, se a língua inglesa não for uma barreira para você e seu filho, a edição importada sai por quase o mesmo preço da nacional. Mas estas comparações não diminuem, de forma alguma, a força que este livro tem em encantar adultos e crianças.

Experimente uma leitura em voz alta. O ritmo, as rimas e o novo enredo que Roald Dahl imprime às velhas histórias são capazes de viciar. Mas tome o cuidado para não se transformar num cara chato que aborda as pessoas indecisas no meio da livraria. Esse papel já é meu!!! Hatuna matata!

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Entre para a turma!!!

Antigamente a gente formava grupos de amigos na rua de casa. Quando o perigo começou a se avizinhar da rua, a turma passou a se formar nos prédios de apartamentos. Os que ainda moravam em casas ficavam reféns do irmão ou da irmã para formar uma turma de dois, três... Com a modernidade, também surgiram as turmas da internet. No meio de tantas mudanças, uma turma nunca sofreu abalo algum: a da escola.

Desde a terceira série minha turma no colégio era formada por mim, Odailton, Bertolino, Rivelino, Edson, Alírio, Arcelon e outros colegas. Na turma tinha o gordinho, o inteligente, o atleta, o puxa saco e outros tipos. Assim era naquele tempo e acredito que assim é até hoje nas escolas do mundo inteiro. Amigos, seguimos juntos até a oitava série. Foram inúmeras as aventuras que vivemos naquele início da década de 80 que trouxe um novo universo infanto-juvenil com a chegada do vídeo game, da BMX, da Turma do Balão Mágico na TV, dos Trapalhões e do Trinity no cinema.

Na turma do Pequeno Nicolau (René Goscinny, com ilustrações de Sempé, Martins Fontes) não foi diferente: O Agnaldo era o primeiro da classe; o Godofredo tinha pai rico; o Eudes era muito forte;o Alceu passava o dia comendo e era gordo; o Rufino era filho de um policial e o Clotário era o último da classe. O tema, universal (as aventuras da turma da escola), até que ajuda a fazer deste livro um sucesso. Publicado na França em 1960 ele ainda hoje oferece tantas delícias.

O autor, que “fala” através da voz e pensamentos do pequeno Nicolau, consegue o mais difícil e sensacional: imaginar idéias e atitudes que só poderiam sair da cabeça de uma criança. E estas crianças são “criativas” como as que tenho em casa. Como a que fui um dia. São crianças comuns que brigam de brincadeira, que enxergam os adultos e suas atitudes de forma diferente. Que dizem o que vem à cabeça sem nenhum constrangimento. São as tais “verdades infantis” e elas se revelam por todo o livro, arrancando principalmente gargalhadas do leitor, seja ele criança ou adulto – sim, eu ri alto até dentro de um ônibus!!!

Nos anos 70, a série de histórias curtas do Pequeno Nicolau foi publicada no Brasil pela Editora Artenova em dois volumes, com tradução de Marcelo Corção. Hoje, você pode ter a sorte de encontrá-los em algum sebo. Atualmente os direitos deste livro pertencem à Martins Fontes que adotou uma nova tradução – de Luis Lorenzo Rivera - e dividiu as histórias em cinco volumes: O Pequeno Nicolau, As férias do Pequeno Nicolau, Novas aventuras do Pequeno Nicolau, O Pequeno Nicolau e seus colegas e O Pequeno Nicolau no recreio .

No primeiro volume, 19 histórias geniais. Fui visitar o Agnaldo e Luisinha contam as visitas e peraltices do Pequeno Nicolau na casa dos amigos. Foi muito divertido fala de um dia em que o protagonista e seu amigo Alceu resolveram faltar à aula. Os boletins... bem, este nem preciso dizer sobre o que é. Os caubóis é a síntese da brincadeira de criança. O futebol... Impossível não rir. A bicicleta mostra o que pode acontecer quando os adultos interferem na brincadeira das crianças... É hilário. Mas não é bobo. As ilustrações de Sempé compõem o conjunto como se fossem três cubos de gelo e uma rodela de limão num copo de coca-cola. Beba tudo!!! Vai valer cada centavo. Diversão em palavras para a família inteira.

Se a rua ficar perigosa, os amigos do prédio viajarem por alguns dias e a escola entrar em férias, não se preocupe. Faça amizade com a turma do Pequeno Nicolau. Você pode levá-los para o quarto, para a sala, para a casa da tia, para onde quiser. E o que é melhor: vai fazer os adultos olharem admirados para você e soltarem a seguinte frase: - Olha como ele é inteligente!!! Aí, capriche na cara de intelectual, engula o riso e continue brincando com sua nova turma. Ler também pode ser uma brincadeira mais que divertida!!!

P.S. René Goscinny, criador do Pequeno Nicolau, é também o autor dos textos de Asterix. Você não conhece as aventuras do personagem Gaulês? Também vale à pena. Comece por Asteriz, o gaulês. Suas personagens já foram ao cinema e ganharam uma série de desenhos animados, mas o melhor são as Histórias em Quadrinhos.

P.S.2. Na primeira foto, euzinho da Silva, na tradicional pose de estudante... nos tempos da turma da escola!!!

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

O Ano do rato!!!

Segundo o Horóscopo Chinês, ontem, 07 de fevereiro, teve início o ano do rato. O rato e os outros onze animais do zodíaco chinês, segundo a lenda, foram as únicas espécimes que se despediram de Buda antes que este deixasse a vida terrena. O roedor, que não tem na China as conotações negativas atribuídas a ele no Ocidente, foi o primeiro a se despedir de Buda, já que chegou confortavelmente até ele montado no boi (o segundo a chegar) e saltou correndo de seu lombo quando o ruminante estava chegando. Dizem que este signo carrega consigo a abundância e a prosperidade. O Tino nasceu num ano do rato (já faz algum tempo...) e, como bons roedores (de livros), esperamos que este seja um ano para comemorarmos novas conquistas no universo da leitura. Que a prometida prosperidade se transforme em mais bibliotecas, mais acesso ao livro e mais apoio a quem, de fato, trabalha com o incentivo à cultura em geral.

Mudando de continente, mas com o foco no roedor, o livro Como as Histórias se Espalharam pelo Mundo (Rogério Andrade Barbosa, com ilustrações de Graça Lima, DCL), conta que elas tiveram origem na África e foram colhidas por um ratinho e guardadas em forma de fios num baú, até que o vento espalhou os cordões multicoloridos por todo o mundo. No início do livro o autor afirma que “o rato, como dizem os contadores de histórias da África, é um bicho muito curioso e inteligente. Nada escapa aos seus sentidos”. Então, seguimos curiosos como os ratos africanos, prósperos como os roedores orientais e, irresistivelmente criativos e persistentes como brasileiros que somos. Um ótimo ano do rato para todos!!! Hatuna Matata.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

O nome dela é BIDDY

Chapeuzinho Vermelho foi até a cabana da vovó, caiu na conversa do lobo e foi devorada. Para a sua sorte, apareceu um caçador que abriu a barriga do lobo e resgatou com vida a vovó e Chapeuzinho. O lobo? Morreu logo depois.

Foi assim que você conheceu essa história? Bem... no princípio, ela não era exatamente assim. A aventura de Chapeuzinho Vermelho vem dos contos da tradição oral, destinada aos adultos dos povoados, concebidos para o entretenimento noturno. Neste contexto, A História da Avó, compilada no século XIX, falava de uma menina que sem querer, comeu a carne e bebeu o sangue da sua avó, ficou nua a pedido do lobo, mas, ao final, deixa-o a ver navios, pois usando de esperteza, foge para sua casa. Com a publicação de Contos de Outrora em 1697, livro do francês Charles Perrault, manteve-se a essência dos contos da tradição oral porém, cortando e/ou modificando alguns elementos, censurando o que poderia chocar, dando a estas historias um ar mais popular, que chegaria a um público mais abrangente. Os contos tratavam de valores morais como gentileza, paciência, obediência e respeito. Seguindo esses preceitos, há sempre um prêmio, uma recompensa. Caso contrário, há uma punição. Quem transgride as regras se expõe ao perigo. Ao final de cada história, Perrault colocava uma moral. Neste livro estão as primeiras versões em texto de A Bela Adormecida, Chapeuzinho Vermelho, Barba Azul, O Gato de Botas, As Fadas, Cinderela, Riquete do Topete e O Pequeno Polegar. Simplesmente uma das obras primas da literatura universal. No texto original de Perrault, a história de Chapeuzinho Vermelho acaba na hora em que ela é devorada pelo lobo. Ponto. Simples assim. A versão que descrevi no início deste texto data de 160 anos depois, e foi escrita pelos irmãos Grimm, adaptada do original francês.

Contos de Outrora pode ser encontrado numa edição recente da editora Landy com tradução de Renata Cordeiro e ilustrações do genial Gustave Doré. Estão lá todas aquelas maravilhosas histórias recolhidas em texto pela primeira vez. Há ainda uma introdução falando sobre os contos, a importância da obra e de seu criador.

Em 2007 a Companhia das das Letrinhas lançou uma edição de Chapeuzinho Vermelho com o texto original de Charles Perrault, traduzido por Rosa Freire d’Aguiar e com belíssimas ilustrações de George Hallensleben. Ao final, um bônus explica, de forma sucinta, precisa, e ricamente ilustrada, a importância deste conto, suas versões e outras curiosidades.

Se você se sente mais confortável com o final escrito pelos irmãos Grimm, a Cosac & Naify publicou Chapeuzinho Vermelho com texto recolhido da segunda edição do livro Contos Infantis e Domésticos, de 1819. A tradução para o português é de Samuel Titan Jr. Mas o que impressiona são as belíssimas ilustrações de Susanne Janssen. A artista apresenta um olhar diferente, fora dos padrões, mas de uma beleza ímpar. O único porém é que a edição, em capa dura, é muito frágil. A que temos em casa, mesmo manuseada com todo o cuidado, teve seu miolo destacado da capa logo nas primeiras leituras. Teve que sofrer uma restauração.

É claro que a história de Chapeuzinho Vermelho sofreu inúmeras adaptações. Autores do mundo inteiro apropriaram-se da menina e do lobo. Poderia fazer uma lista maior, mas quero me prender a três livros onde o conto ganha cores brasileiras.

O livro Chapeuzinho Vermelho e outros contos por imagem do ilustrador carioca Rui de Oliveira apresenta uma versão sem açúcar, próxima das características da oralidade. Mas nem por isso é um livro só para adultos. As crianças de hoje, há muito, convivem com a violência e a sexualidade diariamente na TV. Antes de cada história, o livro apresenta o conto numa versão de Luciana Sandroni. No caso específico de Chapeuzinho Vermelho, ela mantém o final de Perrault, mas incorpora elementos da História da Avó, como o convite do lobo para que a menina tire a roupa e se deite com ele na cama. Rui impressiona com suas ilustrações em preto e branco. Encanta e assusta. Uma forma diferente de ler uma velha história.
É imprescindível falar de Fita Verde no Cabelo – Nova Velha Estória, conto de Guimarães Rosa, publicado originalmente no livro Ave, Palavra, mas que em 1992 ganhou uma edição própria da editora Nova Fronteira com ilustrações incríveis de Roger Mello. O projeto gráfico valoriza um cinza esverdeado – nunca preto. A menina e o lobo ganham um texto poético do escritor mineiro que conversa com a sensibilidade artística do ilustrador candango. Anjos barrocos, moinhos, o interior de Minas, “velhos e velhas que velhavam, homens e mulheres que esperavam”... tudo é novo para o universo tradicional de Chapeuzinho Vermelho. Guimarães Rosa exige do leitor um pouco mais de atenção. Suas frases nunca são óbvias. E isso é ótimo! Saia da mesmice e surpreenda-se com este livro.
Agora, para se ter uma idéia da força que esta história tem, não deixe de ler Nove Chapeuzinhos, livro de Flávio de Souza, publicado pela Companhia das Letrinhas em 2007. O autor já havia brincado com o conto no livro Que História é Essa (1995). Lá, confessa que Chapeuzinho Vermelho é a sua favorita, explica que ela não usa um chapéu e sim um capuz... por fim, revela o nome que Perrault deu a sua personagem mais famosa e que não consta em nossas traduções: BIDDY. Em Nove Chapeuzinhos, Flávio usa a mesma estrutura do conto (uma menina, sua avó e um lobo), mas oferece nove variações. As histórias se passam no período cretáceo, na Índia, na Grécia Antiga, em Pindorama, na Inglaterra da Idade Média, na Capital do Império do Brasil, no Interior de Minas Gerais e no espaço. Todas são INCRÍVEIS, e o texto sempre nos prega uma surpresa. Na Idade Média, o personagem é um menino e se chama Wiliam. Na Grécia Antiga, é Atalanta, uma heroína daqueles tempos. De cada lugar, Flávio pinça algumas curiosidades e a história fica ainda mais gostosa. Para completar, ele convidou um time de ilustradores, cada um responsável por uma versão. Estão lá Marcelo Cipis, Laurabeatriz, Florence Breton, Fernando Vilela, Marilda Castanha, Mariana Massarani, Janaina Tokitaka, Maria Eugênia e Daniel Bueno. Li tudo numa tarde. E já reli alguns contos. Para mim, é mais uma prova de que Chapeuzinho Vermelho continua a encantar crianças e adultos. Embarque nestes livros, viva essa aventura, mas, cuidado, que o lobo pode estar por perto. Hatuna Matata.

Legenda das imagens deste post:
01) Capas dos livros Contos de Outrora e de Chapeuzinho Vermelho, com detalhe de uma ilustração de George Hallensleben;
02) Capa de Chapeuzinho Vermelho versão irmãos Grimm e detalhe de ilustração de Susanne Janssen;
03) Capa do livro Chapeuzinho Vermelho e outros contos por imagem e detalhe de ilustração de Rui de Oliveira;
04) Capa do livro Fita Verde no Cabelo e detalhe de ilustração de Roger Mello;
05) Capa do livro Nove Chapeuzinhos.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Tapetes contam mais histórias em Brasilia!!!

O Tino aprendeu a fazer chuva depois de assistir ao Cadu contar a história de Paulautte, o hipopótamo numa sessão do grupo Tapetes Contadores de Histórias em 2007. Eu aprendi mais técnicas para melhor contar histórias no curso que fiz com a Rosana Reátegui em 2006. Em 2008, mais uma vez em Brasília, reencontramos o grupo em mais uma temporada patrocinada pela Caixa Cultural.

Tudo o que a gente vê ou toca tem história pra contar é um conjunto de ações que englobam uma exposição interativa dos “tapetes”, onde as crianças podem tocar as histórias e personagens, sessões de contação de histórias e oficinas. Na exposição, pais sentam-se com seus filhos e, juntos, descobrem os enredos nos livros ao lado dos tapetes e aí, todos “tocam” as "palavras" dos autores. As histórias de Ruth Rocha, Ana Maria Machado, Ricardo Azevedo, Jutta Bauer, Sérgio Capparelli e tantos outros ganham cores, texturas, formas e ainda mais emoção.

De terça a sexta, o grupo conta histórias diversas. Em fevereiro, de terça a sexta, as sessões acontecem as 10h, 14h e 15h. Se não tiverem grupos agendados, você pode bater um papo com o grupo e escolher as histórias. Eles são de uma gentileza imensurável!!! Ainda às sextas, 19h, para adultos, tem o espetáculo Divinas y Humanas. Sábados e domingos, também as 19h, eles apresentam O Mundo de fora pertence ao mundo de dentro, também só para adultos (é espetacular e o Tino vai escrever um tópico sobre esta apresentação). Sábados e domingos, 16h, Bicho do Mato é uma coleção de histórias para crianças a partir dos 3 anos. O Rei que ficou cego, encenado num cenário gigante repleto de surpresas cênicas, acontece também aos sábados e domingos, 17h.

Andrea Pinheiro estende seu riso largo e acolhedor por todo o espaço; Helena Contente traz no olhar uma bomba explosiva plena em emoções; Rosana casa experiência, simplicidade e criatividade; Cadu (Carlos Eduardo Cinelli) tem uma voz mansa que chega aos nossos ouvidos sem pedir licença e toma conta da nossa atenção assim, quase sem querer; Warley Goulart traz uma delicadeza e uma força no olhar... compõe e canta como se fizesse algo trivial, mas pleno em talento. Não vimos ainda o Edison contando histórias, mas ele – assim como outros - carrega consigo, além do dom de contar histórias, o talento para criar seus próprios tapetes-cenários.

Muito se diz que contar histórias com outros recursos – além do livro – não serve como incentivo à leitura. Fica “apenas” no segmento da pura e simples diversão. Ao ver pais e filhos juntos lendo os livros e procurando viver as histórias também nos “tapetes”, fica claro que foi daquele universo de letras, frases, parágrafos, capítulos, enredos que brotaram as linhas que teceram tanta beleza. Imagino que o grupo carioca faz um trabalho que, despido da formalidade didática, deixa no visitante a sensação de que o livro também é uma delícia. Mas esta é uma longa discussão que não cabe na mala deste texto.

O que posso dizer é que se você, leitor, mora em Brasília, ou passará por aqui até 09 de março, tem a obrigação de conhecer as maravilhas construídas por mãos e vozes do grupo carioca Tapetes Contadores de Histórias. Essa mistura de letras, linhas e fantasia não saiu da prancheta de Niemeyer, mas há quatro anos, no coração da capital do país, de janeiro a março, se torna candanga de coração e passa a ser nosso patrimônio cultural. Eu e Tino estamos por lá quase que diariamente. Descobrindo, aprendendo, levando os filhos e amigos para desfazer o nó da imaginação. A gente se encontra por lá!!! Hatuna Matata!

P.S.1. Para visitar a exposição e assistir as histórias é necessário descalçar os sapatos. Portanto, meias confortáveis são recomendadas. Como o visitante deve ficar agachado e/ou sentado para vivenciar as histórias, em nome do conforto, calças e bermudas também são bem vindas.

P.S.2. Na segunda foto, da esquerda para a direita, Andrea, Helena, Rosana, Warley e Eu. Ao fundo, o incrível cenário da história O Rei que ficou cego. Na última foto, detalhe do livro de pano El Misterio de las islas de Pachacamac, feito por artesão peruanos. Este e outros títulos estão à venda no local.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Cinco Marias

O melhor destas oficinas de brinquedos populares é que além de fazer o brinquedo e levar para casa, a gente (Roedores e crianças) brinca na própria oficina. Foi assim principalmente com os aviões de papel e com as Cinco Marias. Depois que cada criança customizou seus saquinhos, a Vilma abriu a roda e ensinou a turma como brincar. Foi bem divertido. Os pais foram chegando aos poucos, mas imagino que, em casa, todos brincaram juntos - o sentido primeiro de oferecermos estas oficinas: pais e filhos dividindo brincadeiras, sorrisos e fantasias.